SEGUIMENTO DE JESUS = ESVAZIAMENTO DO “EGO”

Data:

“Quem não se desapega de sua própria
vida, não pode ser meu discípulo”
(Lc 14,26)

Para poder entender o sentido do evangelho de
hoje é preciso recordar que Jesus está a caminho de Jerusalém. Ele adverte à
multidão que o acompanhava sobre as
exigências próprias de um autêntico
seguimento; para Ele não basta o entusiasmo passageiro e o fervor momentâneo.
No fundo, Jesus quer verificar as reais
motivações e a sinceridade de atitude
daqueles que estão fazendo caminho com Ele. É preciso ter somente um “foco” no
caminho do seguimento; há sempre o risco de caminhar em diferentes direções,
desviando-se da atenção primeira no caminho de Jesus.

Daí a radicalidade das exigências
de Jesus:
“desapegar-se da família”, “carregar a cruz”,
“renunciar
a tudo que
tem”.
As três se resumem numa só: disponibilidade
total.
Sem ela não pode haver
seguimento.

O seguimento de Jesus é questão de
sedução, de atração, de paixão…; exige um “investimento afetivo” total. O(a)
discípulo(a) pela metade não pode fazer caminho com Jesus; não servem as
entregas pela metade.

Tudo se decide nos afetos. Os
afetos podem nos situar no horizonte maior (seguimento) ou podem nos fixar nas
mediações (família, apego a si mesmo, às coisas…) atrofiando e esvaziando o
impulso do seguimento, travando a liberdade.

A afetividade ordenada nos faz livres
para viver o seguimento de Jesus com mais leveza.

Por isso, é preciso detectar as
aderências e fixações afetivas (apegos) que limitam a liberdade e que podem
minar o seguimento.

 

Seguir Jesus é deixar de viver para o
“eu”,
é descentrar-nos, não ser mais o centro de nosso próprio projeto. O
seguimento brota, pois, de uma “sintonia profunda” com Ele, esvaziando nosso
“eu inflado” para entrar em comunhão com seu modo de viver e com seu Projeto.

Jesus é presença sem mescla de “ego”: o centro de
sua vida não está em si mesmo, mas na comunhão com a vontade do Pai e na
solidariedade com os últimos e sofredores. Diante d’Ele, brota em nós uma
“ressonância interior”, absolutamente iluminadora e motivadora, que desperta,
ativa e mobiliza a segui-lo,
descentrando-nos de nós mesmos. Esta nova experiência
modifica a maneira de perceber toda a realidade: a família, os outros, os bens,
o nosso próprio eu… A
vida mesma é
percebida de um modo novo.

Este é o caminho do Seguimento.
Jesus quer seguidores(as) com liberdade, com decisão e responsabilidade.

Para isso é preciso “renunciar
a tudo”
para ser pessoas, em amor e partilha. “Renunciar a tudo” para
que todos possam ter, para que todos possam compartilhar fraternalmente tudo.

 

O que significa “renunciar a tudo” e
desapegar-se dos seres mais queridos? Significa sair da visão
ego centrada,
nascida da crença errônea de que somos o ego. Talvez pudesse ser expresso desta
forma:
“Deixa de crer que és o eu
separado (e fechado na torre) e descobrirás a riqueza de tua verdadeira
identidade; não vejas nem sequer a tua família a partir do ego, porque sofrerás
e farás sofrer; contempla-os a partir de tua verdadeira identidade, onde todos
sois um, mas sem apego nem comparações”.

Não é a renúncia em si que nos salva, mas o desenvolvimento e a expansão da
vida em direção à plenitude.

A renúncia é sempre lícita e
aconselhável quando se faz por algo melhor. O apego às coisas ou às pessoas
impede-nos de mover com facilidade. Perdemos o fluxo da vida e o impulso do movimento,
a suavidade do “deslizar pela existência”.

 

Os ensinamentos de Jesus, no evangelho deste
domingo, são um chamado ao realismo. Para além das imagens que Ele usa, poderíamos
sintetizá-las assim:
Até
onde estou disposto a ir no seguimento? Estou motivado e decidido a manter

o “sim”
até o final? Estou pronto para viver a fidelidade à causa do Reino, mesmo
correndo o risco de encontrar cruzes?

Sabemos que a cruz só tem sentido quando é
consequência de uma opção autêntica em favor da vida ou de uma verdade assumida:
por exemplo, se sofremos por levar adiante uma causa justa, por defender pessoas,
por evitar um mal ou denunciar uma injustiça… Jesus não morre na cruz para
buscar o sofrimento, mas por ser fiel até o final à sua mensagem: o amor incondicional
de Deus e o compromisso com os excluídos.

Cruz, (“staurós” no grego) não significa
simplesmente patíbulo, instrumento de tortura imposta pelos romanos àqueles que
consideravam transgressores da ordem ou subversivos; significa prontidão, estar
preparado, estar de pé, mobilizado, firme, fiel até o fim… Nesse sentido, a
“cruz-staurós” é vida aberta, expansiva, oblativa, vida descentrada em favor
dos outros; ela é vivida a partir de uma causa: o Reino. A cruz não é um “peso
morto” a ser suportado; ela é consequência de uma opção radical em favor da
vida; a

cruz não significa passividade e
resignação, pois ela brota de uma vida plena e transbordante; a cruz resume,
concentra, radicaliza, condensa o significado de uma vida vivida na fidelidade
ao Pai, que quer que todos vivam intensamente.

 

Existem
cruzes que são vazias, sem sentido, insensatas…, pois elas fecham a pessoa
em si mesma, no seu sofrimento e angústia; não apontam para o futuro, para a
vida. São cruzes que brotam dos fracassos, dos traumas, das rejeições, das
experiências frustrantes… e que não foram integradas Tornam-se um “peso
morto” pois não abrem um horizonte de sentido; elas se fixam no passado, na
mortificação, no ritualismo vazio… com a intenção de agradar a Deus. Fazer o
caminho com Jesus, que carrega a cruz da fidelidade, ajuda a romper com as
cruzes que afundam no desespero e no fracasso.

Assim entendemos a afirmação de
Jesus no evangelho deste domingo:
“quem
não carrega sua cruz e não

caminha atrás de mim, não pode ser meu
discípulo”
(Lc
14,27). Carregar a cruz significa esvaziamento do próprio “ego” para viver em
sintonia com a causa de Jesus e a fidelidade no compromisso com os outros.

É gratificante trazer à memória tantos homens e
mulheres que são presença compassiva e, à maneira de Jesus, arriscam suas vidas
em favor da vida; histórias silenciosas de tantas pessoas que com sua presença
ajudam os outros a viver; pessoas que revelam a paixão por viver em pequenas
paciências cotidianas, que entregam suas vidas no escondimento, sem vozes que
as exaltem; elas são como o fermento silencioso que se dissolve na massa para
fazê-la crescer.

 

A cruz,
desligada de uma vida comprometida, não tem sentido; nela mesma, não salva; ela
é salvífica quando é assumida e vivida em favor dos demais. Nunca é sofrimento
buscado, como se Deus necessitasse de nossa dor para nos redimir.

A Cruz liberta quando não acaba na cruz, mas na
ressurreição. Enquanto a carregamos, ela se torna leve se temos diante de nós
um horizonte de esperança.
“Vinde a mim todos vós que estais fatigados e sobrecarregados,
e eu vos darei

descanso.
Porque meu jugo é suave e meu peso é leve”
(Mt 11,28-30).

“Carregar a cruz” não é ser amigo
da dor, mas sinal de lucidez. Significa assumir que toda a existência é um
caminho progressivo de “morte do ego” (de identificação com ele), para
possibilitar que “nasça” e viva o que realmente somos. Como dissera o próprio
Jesus, se trata de “perder para ganhar”, morrer para viver.

 

Texto bíblico
Lc
14,25-33

 Na oração: a sua maneira de viver o
seguimento de Jesus faz diferença no

                    seu ambiente cotidiano
(família, trabalho, relações…)?


Você já fez a experiência de encontrar oposição e perseguição por sua
fidelidade aos valores do Evangelho?


Em que circunstâncias da vida o “ego inflado” tem aparecido? Você se deixa
determinar por ele ou pela vida verdadeira que se revela como esvaziamento?

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