“As jovens
previdentes levaram vasilhas de azeite junto com as lamparinas” (Mt 25,4)
Os textos
evangélicos destes últimos domingos do ano litúrgico nos convidam a velar, a
estar mobilizados, numa atitude de expectativa diante do Deus que sempre está
vindo ao nosso encontro. Ele não nos espera no final do caminho para nos submeter
a um juízo. Não, Deus está em nós todos os instantes de nossa vida para que
possamos levá-la à plenitude, ou seja, para salvar-nos n’Ele.
É preciso
estar alerta, porque o tempo passa. Se estamos distraídos e adormecidos, é
preciso despertar, porque do contrário perderemos a oportunidade de “entrar na festa
de casamento”.
Neste
domingo, a parábola de Jesus nos convida a não ficarmos sem azeite em nossas humildes
lamparinas, para que nossa presença cristificada brilhe como luz potente nos
momentos oportunos. É o momento de nos perguntar sobre qual fundamento está
assentada nossa esperança (espera ativa).
Nas
esperas, muitas vezes esquecemos de manter a chama acesa. A parábola das dez
virgens nos chama atenção para isso. Talvez porque passamos a vida esperando
passivamente, sem saber o quê ou quem, e não desfrutamos dos encontros que a
mesma vida nos proporciona. Muitas vezes vivemos condicionados pelo anseio de
algo que está à frente, de um futuro que sonhamos e que, às vezes, quando
chega, não corresponde às nossas expectativas. Nestas esperas indefinidas e
estéreis vamos desperdiçando o azeite das lamparinas, vamos nos gastando a nós
mesmos na superficialidade e na falta de compromissos.
Lida em seu
sentido literal, a parábola deste domingo parece cair numa contradição, já que
as jovens “sensatas” aparecem como egoístas, quando se negar a partilhar seu
azeite com as do outro grupo.
Mas, toda
parábola busca ser provocativa e não podemos nos limitar a uma leitura
literalista da mesma. Trata-se de identificar o objetivo que ela indica. E,
neste caso, parece claro que ela procura destacar outra questão: a importância
decisiva de ter acesso às reservas de “azeite”, como reserva de “vida” diante
da vinda surpreendente do “noivo”.
No relato,
o azeite é aquilo que alimenta a lamparina, ou seja, que torna possível a luz.
Com isso, o eixo da parábola nos remete a esta questão: que é que possibilita,
mantém e alimenta a luz em nossas vidas?
Qual é o
azeite que faz arder a nossa lamparina existencial?
Toda pessoa possui reserva
abundante de azeite em seu interior, como algo próprio dela e é, portanto,
intransferível: é o dom da existência, a vida em seu sentido mais profundo. O
azeite não é algo que se possa dar e receber, que é oferecido a partir de fora,
como uma coisa objetiva que um homem ou mulher pudessem dispor de si mesmos; o
azeite é vida profunda, a mesma vida humana que o homem e a mulher devem
cultivar, sendo eles mesmos.
Homens e mulheres são ‘azeite” que
ilumina enquanto se consome, fazendo-se luz diante de Deus e dos outros. Este é
o distintivo mais precioso do ser humano, sua essência original: o bom azeite
que ilumina.
Em nossa
identidade profunda, “somos luz”, afirmação que o evangelista
Mateus põe na boca de Jesus: “Vós sois a luz do mundo” (Mt 5,14). No entanto,
com frequência desconhecemos essa realidade, desconectados dela e, como
consequência, permanecemos na obscuridade da ignorância essencial, com a
confusão e o sofrimento que isso traz. Nessas condições, faz-se vital esta
questão: qual é o “azeite” que alimenta nossa luz e nos permite viver em
conexão com ela?
A resposta só pode ser esta: a
compreensão experiencial daquilo que somos.
Para começar, a pessoa interessada
pode verificar isso por si mesma a partir de um questionamento elementar: que
é o que lhe traz serenidade, paz, plenitude, amor, vitalidade, criatividade...?
De onde brota tudo isso e que se mantém mesmo em circunstâncias adversas? Ou,
pode-se também fazer o mesmo questionamento sob outro ângulo: o que é que lhe
altera, lhe fecha, lhe faz sofrer, lhe desconecta da vida...?
Em resumo: tudo se concentra no
fato de vivermos ou não conectados ao que realmente somos. Essa compreensão
experiencial é luz; sua carência é obscuridade.
O passo seguinte surge por si
mesmo: como fazermos a provisão de “azeite”? Conectar-nos continuamente, de
maneira consciente, com aquilo que somos, com aquilo que está mais além do
corpo, da mente, do psiquismo, do ego, ...
Nas dimensões mais profundas de nosso ser continuam existindo lugares
onde a luz permanece brilhando e nos quais o azeite transborda. São esses
lugares invisíveis que só percebemos quando vivemos a partir do coração. Tais
lugares invisíveis coincidem com as dimensões sadias que nos habitam:
sentimentos elevados, desejos nobres, pensamentos oblativos... São sadias
porque a sensatez de seu candil vai nos indicando o valor das coisas pequenas
que passam quase desapercebidas. São realidades pequenas (como o grão de
mostarda, uma medida de fermento ou uma moeda perdida), mas carregadas de
eternidade. Quando habitamos estes lugares, o tempo se faz mais denso e
palpável, a sensibilidade se torna mais refinada, a visão se amplia e um
sentimento de profunda gratidão nos invade. Não estamos nas montanhas
inacessíveis ou nos desertos impossíveis; estamos no cotidiano luminoso que não
percebemos devidos às pressas estressantes ou pelo esquecimento de buscar o
perfeito que não existe. É questão de sensatez de vida.
“Há dentro de nós uma
chama sagrada coberta pelas cinzas do consumismo, da busca de bens materiais,
de uma vida distraída das coisas essenciais. É preciso remover tais cinzas e
despertar a chama sagrada. E então irradiaremos. Seremos como um Sol”. (L.Boff)
No fundo, todos
somos as dez jovens da parábola; todos vamos fazendo um caminho de aprendizagem
para o amor. Mas, é preciso retomar a questão central: quem sou eu diante de
Deus que vem, que está conduzindo minha vida? Tenho azeite o suficiente, sou
portador da luz de Deus?
Esta é a
esperança que Jesus alimentava: Ele queria constituir um povo de pessoas
luminosas, uma cidade de pessoas transformadas em luz. Assim quer Jesus que
seja sua Igreja: uma multidão de gente que ilumina de forma generosa,
presenteando sua luz, gratuitamente, para que todos vejam e vivam em concórdia.
Aqui não há
luta da luz contra as trevas, mas iluminação de vida: que todos possam ver,
porque a luz recebida é presenteada a todos.
O ser
humano é portador de uma luz que o transborda e que se expressa no seu corpo,
nos seus gestos, nas suas ações solidárias e que são a verdadeira lâmpada de
Deus no mundo. Um ser portador do melhor azeite e transparente: essa é a benção
de Deus, o dom maior, a vida mesma feita luz e comunicação.
Somos “luz do mundo”, uma chama que nunca se apaga. Somos “sarça ardente” para os outros,
consumindo-nos constantemente, na entrega e no serviço.
Somos uma lamparina humilde,
brilhando na janela da nossa pobre casa, indicando aos outros o caminho da
segurança e do aconchego.
Texto bíblico: Mt
25,1-13
Na oração: Dentro de ti deves descobrir o azeite, pois teu interior tem reservas deste precioso dom. Se acessas a ele, darás luz que iluminará teus passos. Essa chama, se é autêntica, não poderá ficar oculta, mas que iluminará também todos os outros.
É preciso descobrir
teu próprio azeite: é o que há de mais original e divino em teu coração.
Ninguém pode emprestá-lo, porque é tua própria vida. Toda vida se move de
dentro para fora.
Deixa-te iluminar, leve a Luz nas tuas pobres e frágeis mãos, iluminando os recantos do teu cotidiano.