A cada altura da vida o exercitante tem uma nova perspectiva do seu passado, da sua história. O jovem noviço, a jovem noviça, o leigo que olha, à luz da revelação que lhe é dada em exercícios iniciais, terá, sem dúvida, muito proveito numa oração profunda e sincera de revisão de vida. O homem e a mulher mais “adultos” e “crescidos” na experiência cristã certamente terão outro proveito e outras descobertas.
Haverá quem se aplique a uma revisão destas fora do seio da Trindade, do ambiente amoroso de Deus, que é Redentor, Amigo Fiel e verdadeiro. Por isso é fundamental que o orientador insista com a pessoa que reza a colocar-se na presença de Deus, fazendo sua oração preparatória e dando outros passos para que, de fato, entre em oração e não fique numa conversa consigo mesma, num monólogo interior.
Mas quem procurar passar etapa por etapa a sua vida verá as “pedras” que lhe foram atiradas e as “pedras” que atirou contra os outros. Com a graça iluminadora de Deus, dar-se-á conta das pedras que deixou “por aí”, sem se ocupar em usá-las em uma construção útil a si e aos outros, para edificação própria, do próximo, da Igreja, da família humana.
No Coração de Cristo, contemplado na Cruz, diante da prova definitiva de que sou amado(a), todas as “pedras” recolhidas se transformarão! Virá a clareza de que a história pessoal de sofrer e fazer sofrer pelo pecado — pela frieza no amor, pela frouxidão na vida cristã, pelo desleixo em aproveitar o Dom — pode ser “reciclada” e mudada de história de pecado — afastamento, indiferença, falta de atenção ao Amor — em história pessoal de salvação, integrada na grande História da Salvação.
Portanto, nas várias etapas da vida, não tenha medo de ouvir o conselho sincero e eficaz de Santo Inácio: “Pedir o que quero: aqui será pedir profunda e intensa dor e lágrimas por meus pecados. O primeiro ponto é a sequência dos pecados, isto é, trazer à memória todos os pecados da vida, examinando-a ano por ano ou época por época. Para isto são úteis três coisas: 1) contemplar os lugares ou casas onde morei; 2) o trato que tive com outras pessoas; 3) os trabalhos que desempenhei… Ponderar os pecados, olhando a fealdade e a malícia que contém em si cada pecado mortal cometido, mesmo que não fosse proibido” (EE 56-57).
Santa Teresinha, que não tinha pecados graves na sua vida, aplicando-se a um exercício semelhante, pôde intuir a mão paterna e amiga de Deus impedindo-a de cair. Assim, sentiu-se irmanada a Santa Maria Madalena, a que muito amou porque muito lhe foi perdoado.
Haverá pessoas que não fizeram grandes maldades. Mas sua vida está vazia, pois não têm aproveitado os talentos e dons, têm enterrado o tesouro da sua fé, recusando-se por falsa modéstia, comodismo, timidez espiritual a “sair da toca”. É do tipo que diz: “Não faço mal a ninguém! Não ponho o pé fora de minha porta!”. Na oração, perguntando-se — diante do Crucificado — “como o Criador veio a fazer-se homem, e como da vida eterna chegou à morte temporal e assim veio a morrer por meus pecados” (EE 53), com a graça de Deus, ela poderá sair do seu sono e partir para uma vida atuante no Espírito, uma vida de caridade operante, solidariedade viva e eficaz, amando, como Jesus, “até o extremo” (Jo 13,1).
|| E X E R C Í C I O ||
|| E X E R C Í C I O ||
Faço parte da História do Pecado (EE 55-58)
Prevejo o lugar, a posição corporal, o tempo e o modo de orar, que aqui será a meditação. Acalmo-me, como em algum dos exercícios anteriores. Faço a oração preparatória: “Senhor, que todos os meus desejos e aspirações, tudo o que faço e me acontece seja ordenado puramente em seu serviço e seu louvor”.
Prevejo o lugar, a posição corporal, o tempo e o modo de orar, que aqui será a meditação. Acalmo-me, como em algum dos exercícios anteriores. Faço a oração preparatória: “Senhor, que todos os meus desejos e aspirações, tudo o que faço e me acontece seja ordenado puramente em seu serviço e seu louvor”.
Composição, vendo o lugar: imagino-me vítima de sequestro, preso(a), amarrado(a), ou qualquer outra situação em que esteja enredado(a) em consequência dos meus pecados. Pedir o que quero: aqui será a graça de profunda e sincera dor pela minha resposta ingrata ao Senhor, isto é, o meu pecado.
Lembrete: meditar não é refletir apenas ou tirar uma mensagem. Mas a minha memória me recorda o assunto; a minha inteligência, refletindo, percebe o que toca, move, afeta a minha vontade; a minha vontade, afetada, volta-se para Deus, pedindo perdão, suplicando, confidenciando, agradecendo, tomando resoluções…
Meditando, digo a mim mesmo(a): “Faço parte da história do pecado!”. Recordo esta verdade como ela se mostra na história da minha vida… Procuro dar-me conta, com a graça de Deus, da gravidade e da malícia, da ingratidão e da infidelidade, do pecado cometido contra a bondade infinita do meu Criador que me chamou à existência, à fé…
Leio Mateus 18,5-10 e deixo este Evangelho repercutir em mim. “Escândalo” é a presença do mal em mim. Jesus me previne como precaver-me. Medito, percorrendo as etapas de minha vida. Oro.
Observo como os astros no seu percurso incansável espelham a harmonia que vem da sabedoria de Deus, e como eu tenho sido causa de divisão, discórdia, separação.
Considero como a liberdade humana pode virar-se contra Deus, sem contar com ele. Em consequência, o amor se perverte em egoísmo, vingança, inveja; o desejo natural de ter bens, em cobiça, roubo, exploração; o exercício do poder, em soberba, opressão; o prazer, em comodismo, luxúria; o conhecimento, em manipulação; a liberdade, em libertinagem; a verdade, em mentira, disfarce… Assim a vida sofre agressões e até se extingue com a morte.
Na verdade, devo reconhecer que há em mim uma “chaga”, uma ferida de onde brotam pus, infecção, veneno…
Rezo diante da Cruz: “Quando estávamos mortos por nossas faltas, ele nos deu a vida com Cristo” (Ef 2,4). “Fomos criados em Cristo para as boas obras” (Ef 2,10). Procuro sentir-me nos braços misericordiosos do Crucificado, o Bom Jesus.
Vou terminando, expandindo-me num colóquio de sincera ação de graças, pois sou capaz de tanta frieza diante do Amor, sou tão pouco fiel! E ele é cheio de generosidade, misericórdia… Rezo Glória.
Não quero esquecer de examinar, diante de meu Deus, como se passou a oração e anotar, depois, alguma coisa de proveito.
Texto retirado do livro Cristo "Mais conhecer, para mais amar e servir!" - Edições Loyola - 2010
Autores: Maria Fátima Maldaner, SND / Pe. R. Paiva, SJ