As Escrituras ensinam que “o conhecimento do mal não é sabedoria” (Eclo 19,22). Ensinam também que só “os puros de coração verão a Deus” (Mt 5,8). Assim, não ajuda a entrar em sintonia com o Espírito do Pai e do Filho um tipo de “exame” que seja a procura de tudo o que você fez de errado, falho, pecaminoso. Também não leva a nada querer viver o Evangelho, afeiçoar-se e configurar-se a Jesus Cristo sem purificação do coração. É por isso que Inácio coloca, logo depois do Princípio e Fundamento, duas orações de exame, cuidadosamente explicadas, além de uma inspirada descrição da tentação e do pecado, antes de propor qualquer exercício! Do número 24 ao 31 ele propõe o “Exame particular e cotidiano”; do 32 ao 43, o “Exame geral de consciência para se purificar e melhor confessar”. Inspirados nestas sugestões e na “Contemplação para Alcançar Amor” (EE 230-237), foi surgindo a experiência de uma “pausa amorosa” diária para conferir a jornada com o Amigo Fiel.
Há uma dimensão batismal neste modo de colocar as coisas: o Batismo é uma renúncia ao mal, para, então, aderir a Cristo e à nova vida do Evangelho. Quem se dispõe, graças a Deus, a fazer os Exercícios se dispõe a reviver o seu Batismo!
Por isso, Inácio propõe começar reconhecendo a graça. Nada de procurar, às vezes até “ciscando” no terreiro da vida, o que há de ruim e deteriorado nela! Nada de “conhecimento do mal”! Depois de se dispor o melhor possível na presença dos olhos bondosos e claros do nosso Salvador, você começa a dar graças (1º) a Ele pelos benefícios recebidos. Não “cisca o lixo”, mas “garimpa os diamantes”. Só então pede graça para conhecer os pecados e rejeitá-los (2º), e neste clima de confiança e claridade começa “a pedir contas a você mesmo(a), repassando o período desde o momento de se levantar até o momento presente… (3º). Havendo faltas, então peça perdão (4º) e se proponha a emendar-se, com a graça de Deus (5º). Aí reze, gostosamente, o Pai-nosso.
Esta primeira proposta vai adquirir novas dimensões. Se Deus quiser, vamos percebê-lo adiante!
E X E R C Í
C I O :
“Felizes os puros de coração, porque eles verão Deus!” (Mt 5,8)
Oração… Rezar, encontrar-se com Deus, sim! Mas, sobretudo, oração de busca, oração para encontrar a vontade de Deus para mim, oração “discernida”. Tornar-se pessoa de discernimento dos seus atos e da sua oração, uma atitude a ser conquistada por meio do exercício persistente e cotidiano da oração de discernimento, o exame. Vou ao Exercício. Escolho a hora mais favorável e quero procurar mantê-la dia a dia.
Repouso o corpo e o espírito. Acolho a presença amorosa de Deus e inicio. Agradeço! Sou filho(a) de Deus. Dou-me conta do carinho do Pai pela minha vida hoje: vida do corpo e do espírito; benefícios de ordem material e espiritual. Agradeço pelo bom e pelo menos bom que hoje aconteceu comigo, em torno de mim, no mundo. Obrigado, Senhor, Salvador de todos!
Que a luz do Espírito venha sobre mim, para que eu possa perceber ainda melhor as dádivas do Senhor, bem como os limites, falhas e resistências no meu modo agir e reagir.
Faço uma pausa. Revejo com os olhos da fé a minha vida de adesão à luz de Jesus Cristo e do seu Evangelho: por onde Deus entrou na minha vida hoje? Oração, leituras, encontros, trabalhos, acontecimentos… Onde e como fui “sinal” de Jesus? Onde e como atendi ao Espírito?
Percorro o meu dia, hora por hora, lugar por lugar, simplesmente deixando passar o sucedido e o vivido, sem atitude de julgar as minhas ações, os meus pensamentos e desejos. Será que houve momentos de “trevas”, de fuga, atalhos que revelam um coração menos generoso e até resistente no seguimento de Jesus Cristo? Neste caso, peço perdão e inspirações para me corrigir.
Preparo a volta. Entro em diálogo com Deus a respeito daquilo que me parece ter sido bom e daquilo que lhe parece limitado ou até ruim. No humilde reconhecimento da própria fragilidade, como pessoa chamada à liberdade, digo: “Perdão, Senhor! Dispõe-me para alcançar emenda!”.
Concluindo: “Fica comigo, Senhor!”. Oro… Entrego-me… Recomeço na esperança de que, com Ele, amanhã sempre será melhor! Pai nosso!
Texto retirado do livro Cristo "Mais conhecer, para mais amar e servir!" - Edições Loyola - 2010
Autores: Maria Fátima Maldaner, SND / Pe. R. Paiva, SJ